sexta-feira, 24 de julho de 2009

Bandas e Fanfarras

Os Desfiles Cívicos e a música de Bandas e Fanfarras


A infância de Gilberto Gil, repleta de sons interioranos que seriam evocados mais tarde em suas canções, reservou com certeza um lugar para o som das bandas e fanfarras que animavam os desfiles cívicos.

Erroneamente associados ao período militar brasileiro - que não criou, mas apenas incentivou eventos desta natureza - os desfiles cívicos parecem, ao menos nas grandes capitais, ter perdido a enorme popularidade de que gozavam há várias gerações.

Por exemplo, durante o período do Estado Novo, 1937-1945, houve uma preocupação do governo Getúlio Vargas em estimular o sentimento patriótico nas escolas e agremiações civis. O aspecto mais incisivo desta prática na área musical foi a organização, a cargo do maestro Heitor Villa-Lobos - compositor, didata e maior expoente da corrente nacionalista na música brasileira - dos Orfeões.

O canto orfeônico (Orfeão equivale a coral amador) introduziu o ensino obrigatório da música nas escolas, e seu repertório era baseado integralmente em canções que valorizassem a cultura nacional e exaltassem os valores da pátria.

O fim do Estado Novo e do movimento orfeônico deixou um vácuo que foi parcialmente preenchido pelas Bandas e Fanfarras, agremiações musicais de inspiração européia cuja tradição entre nós remonta desde o Império. Estas passaram a encabeçar os desfiles cívicos, observados em várias datas, mas, concentrados no dia da Independência do Brasil, 07 de setembro.


Entendendo as Bandas e Fanfarras

O conceito de Banda Marcial foi popularizado pelos antigos romanos, provavelmente influenciados pelos gregos, cuja formação cultural valorizava tanto a disciplina física na formação militar quanto à sensibilidade artística para a música.

A especialização de funções dentro das organizações militares reservou um lugar para os músicos que habitualmente encabeçam as paradas militares. A natureza de tais desfiles obrigou uma seleção de instrumentos musicais baseada em sua portabilidade, facilidade de manejo e potência sonora.

As modernas bandas marciais e bandas musicais desenvolveram-se sobre a influência do modelo americano das marching bands, ao passo que as fanfarras mantiveram uma característica técnica de maior simplicidade, devido aos recursos instrumentais mais limitados. Como curiosidade, podemos relatar que as pequenas bandas que deram origem aos grupos executantes do frevo em Pernambuco eram às vezes chamadas de Fanfarras.

A título de esclarecimento, convenciona-se que as Fanfarras são grupos instrumentais compostos exclusivamente por instrumentos de percussão e sopros de metal; já as Bandas possuem também, além dos já citados, instrumentos de sopro de madeira. Ambos os tipos de conjunto diferenciam-se das orquestras (além, é claro, da finalidade diversa) pela ausência de instrumentos de cordas.

Quantos aos instrumentos presentes nas Fanfarras e Bandas podemos relacionar:

· Instrumentos de sopro de metal lisos, que caracterizam a fanfarra simples: Corneta em Fá e Si bemol, Clarim em Mi bemol, Cornetão em Fá e Mi bemol.

· Instrumentos de sopro de metal dotados de válvulas, que caracterizam a fanfarra com pisto: Bombardino em Si bemol, Fá e Mi bemol, Baixo Tuba ou Sousafone nas mesmas tonalidades e eventualmente Trompete em Si bemol.

· Instrumentos de percussão: Bombo Fuzileiro, Surdo gigante (90cm), Mor (60cm) e Médio (30cm), Atabaque ou Timbale, pares de Pratos de 14 ou 16 polegadas, Caixa Clara ou Tarol (rasa e aguda) e Caixa de Guerra (profunda e grave) e eventualmente Lira diatônica (metalofones com afinação).

· Instrumentos de sopro de Madeira: Flauta Transversal, Flautim ou Picollo (flauta extremamente aguda), Clarineta, Requinta (Clarineta reduzida) e Saxofone.

Além da instrumentação, devemos notar que as Fanfarras e Bandas Marciais possuem uma série de elementos "alegóricos" que são inclusive parâmetros para julgamento em concursos:
· Pelotão cívico: grupo de alunos portando a bandeira nacionai, estadual, municipal e a da escola, ladeado por Guardas de Honra. Não faz evoluções.

· Estandarte: aluno que leva a identificação (estandarte com o nome) da corporação musical que se apresenta, juntamente com sua Guarda de Honra. Assim como o Pelotão Cívico, este grupo não faz evoluções e nem coreografias.

· Porta cartel: alunos que portam a identificação da categoria da corporação musical e que podem fazer evoluções ou coreografias por serem destaques da fanfarra.
· Pelotão ou Corpo Coreográfico: formado geralmente por alunas (em número não inferior a doze) que fazem coreografias durante a execução das peças musicais executadas pela Fanfarra ou Banda.

· Baliza: aluno, ou aluna, escolhida dentro do conjunto que realizam evoluções, malabarismo e coreografias livres ou coordenadas à frente da banda ou fanfarra.

· Mor: condutor do grupo musical no desfile, que desempenha às vezes as funções de diretor musical, ensaiador e regente. Além da condução musical propriamente dita, o Mor tem sob sua responsabilidade a manutenção da ordem única e a coordenação das coreografias.

· Comissão de frente: grupo de função e número de componentes variável, encarregado de encorpar e sofisticar as evoluções e coreografias no desfile.


Idéias perigosas: a natureza das perseguições política

Com a criação da ONU (em 1945, ao final da Segunda Grande Guerra) e a publicação da Declaração Universal dos Direitos do Homem, manifestou-se uma grande preocupação no sentido de assegurar garantias mínimas baseadas no direito internacional.

Na prática, na maioria dos países - com exceção dos desenvolvidos, em que as instituições são fortes e estáveis - parece não haver garantias de que os cidadãos não sejam perseguidos por suas posições étnicas, religiosas ou políticas.

Como sabemos, Gilberto Gil, juntamente com Caetano Veloso, foi perseguido pelo regime militar e preso em 1968, sendo "convidado" a sair do país em 1970, num exílio do qual, ambos só retornariam dois anos mais tarde.

O curioso é que a sentença dos perseguidores baseou-se aparentemente na ignorância da proposta estética do Tropicalismo, e não na presença explícita de algum conteúdo político divergente nas letras das músicas.

Este fato exemplifica bem a natureza da perseguição política, apoiada sempre muito mais na intolerância à diversidade, à intelectualidade e à cultura, do que em temores justificados por conspirações reais.

A punição com o exílio particularmente é uma das mais traumáticas, por afastar o indivíduo de seu círculo de relações, de seu trabalho, enfim, da vida que ele construiu. Tradicionalmente é reservada para os acusados de conspiração política, e temos exemplos desta pena desde o período Colonial.

Durante o período do governo militar brasileiro, 1964-1985, inúmeros cidadãos - políticos, artistas, intelectuais, professores, líderes sindicais e estudantis - foram colocados na clandestinidade, principalmente após a promulgação do famigerado Ato Institucional nº 5 (AI-5). A liberdade de imprensa e os direitos do eleitor também sofreriam conseqüências amargas que só seriam superadas quase vinte anos depois.

A história recente do Brasil mostra o quão longe podem chegar o arbítrio e a injustiça, com a agravante de que grandes parcelas da sociedade, mesmo sabendo da existência de prisões e torturas motivadas politicamente, preferiram ignorar o rumo dos acontecimentos, ou pior ainda, apoiar a legitimidade da chamada "guerra suja".

A lição que a História nos dá é a de que a injustiça contra um o é contra todos. Isto quer dizer que, numa sociedade democrática, mesmo que a violência da repressão não nos atinja diretamente, nos encontramos tão ameaçados quanto às vítimas mais evidentes, uma vez que o direito desrespeitado pertence a todos.

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